Montagem do texto de B.Brecht com Cia Phila7, Paulo César Pereio e Orquestra de Câmara da USP

Beth Néspoli escreve para ‘O Estado de SP’ (08/04/2005)

Autora do livro História do Teatro Mundial, lançado no Brasil pela Editora Perspectiva, Margot Berthold dedica várias páginas do alentado volume ao teatro épico desenvolvido por Bertolt Brecht (1898-1956), autor cuja dramaturgia de cunho político, segundo ela, desafia o dogmatismo ideológico.

“Suas peças não apresentam palavras de ordem – desmascaram fatos”, escreve a historiadora. Quem ainda duvida não deve deixar de conhecer Vida de Galileu, uma das peças mais bem escritas e instigantes de toda a vasta obra desse autor alemão.

Com o título Galileo Galilei, esse texto que valeu uma das melhores criações do Teatro Oficina volta a ser encenado graças a uma iniciativa conjunta da Orquestra de Câmara da USP, dirigida pelo maestro Gil Jardim, e do diretor teatral Rubens Velloso.

Com a participação dos 35 músicos da orquestra, um coral de oito vozes, onze atores e Paulo César Pereio como protagonista, Galileo Galilei faz nesta sexta-feira sua primeira récita aberta ao público no Teatro Alfa, mas é bom se apressar, pois serão apenas sete.

“A idéia inicial veio do maestro Gil, que queria abrir a temporada da orquestra com um trabalho que unisse diferentes linguagens”, diz Rubens Velloso. “Como sou fascinado por essa peça desde que vi a montagem do Oficina, não tive dúvidas.”

Fiel à proposta de mesclar linguagens, desejada pelo maestro, no palco serão projetadas imagens sobre uma tela que separa público e atores. “Não há abuso de projeções”, garante Velloso. “Serão usadas em momentos precisos, por exemplo, de explosões de estrelas num céu em convulsão, imagens feitas pela Nasa.”

As músicas também foram escolhidas de forma cuidadosa. Entre os compositores há desde Vicenzo Galileo, pai do personagem central, até contemporâneos como Arvo Part.

Rubens Velloso lembra que estamos no Ano Internacional da Física. “Embora o mais importante seja mesmo poder levar esse texto maravilhoso ao palco.”

Nessa peça, importa a Brecht a influência das descobertas de Galileu na vida do cidadão comum. Se a Terra não é o centro do universo, então a Igreja está errada? Mas se o seu poder está fundado no conhecimento, como fica? Daí a relevância da atitude de Galileu, de negar sua teoria para salvar sua pele.

Filho do músico Vicenzo, Galileu nasceu em Pisa em 1564 e estudou em Florença na infância. De volta à cidade natal, abandonou a faculdade de medicina pela de matemática e seria como professor dessa matéria que iria sobreviver.

Os biógrafos o descrevem como um homem temperamental capaz de apreciar igualmente uma boa discussão científica, um prato requintado e uma bela companhia feminina.

No início de suas pesquisas, aperfeiçoou a luneta – que fora trazida por um aluno e ele a vendeu como se fosse sua descoberta – e começa a estudar o movimento dos astros.

Nega a física aristotélica e, unindo a teoria heliocêntrica de Copérnico com suas observações ao telescópio, prova que a Terra não é o centro do universo, mas movimenta-se em torno do Sol. Descobre os anéis de Saturno, estuda as manchas solares.

Em 1933 é processado pela Santa Inquisição, que proibira a teoria de Copérnico e, diante dos instrumentos de tortura, abjura publicamente. A partir daí, vive em prisão domiciliar, sob vigilância da Igreja.

Cego e vigiado, ainda assim consegue escrever e contrabandear, por meio de um ex-aluno, seus estudos científicos para a Holanda, onde são publicados. Morre aos 78 anos, na companhia de uma filha.

Em sua peça, Brecht mostra as múltiplas facetas desse homem, desde sua fé cega na razão até sua covardia, sem esquecer sua sensualidade. A famosa frase, “infeliz a terra que precisa de heróis” é dita por Galileu pouco depois de abjurar.

Quem quiser conhecer melhor as descobertas de Galileu terá a oportunidade: no palco, o astrofísico Reinaldo de Carvalho fará uma breve palestra sobre cosmologia pouco antes do início do espetáculo.

O Teatro Alfa fica na rua Bento Branco de Andrade Filho, 722, Santo Amaro, SP. O espetáculo fica em cartaz até o dia 17, de 5.ª a sáb., 21h e dom., 18h.
(O Estado de SP, 8/4)

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