O espetáculo “FEBRE” visa o debate sobre a despersonalização do indivíduo dentro do sistema capitalista de consumo.
As múltiplas vertentes, que determinam nossos hábitos, posturas e conceitos, são a matéria prima desta pesquisa de linguagem cênica. Todo ser social repete padrões coletivos, alguns superficiais e inofensivos, outros essencialmente perigosos. A palavra “FEBRE” assimila conceitos positivos e negativos como: “paixão”, “fascinação”, “moda”, “mania”, “delírio”, “obsessão”, “vício”, “compulsão”e “fanatismo”.

Dramaturgia como arma. Escrita no momento histórico da invasão do Iraque pelos E.U.A, a peça recontextualiza os conceitos de Imperialismo, Guerra e Terrorismo, numa escala familiar, micro-cósmica, traçando um paralelo com “Oréstia” do grego Ésquilo. Febre tem uma estrutura poética não-linear. A narrativa se desenvolve como uma jornada no inconsciente de Diana, a personagem protagonista, e podemos considerar que toda a ação se passa em sua mente. Seu conturbado universo mental é um campo minado, um território fértil em miragens e “desilusões de ótica”. Num estado febril, de delírio e devaneio, Diana recria signos e fatos de sua memória, vibrando num estado de consciência alterado. O confronto com os fantasmas da família é aqui uma metáfora de poder e manipulação. A revolta contra o usurpador, contra o genitor opressor é recriada como uma batalha pela sobrevivência e evolução. Os alter-egos da protagonista Diana são arquétipos que ecoam no labirinto psicanalítico; personificações monstruosas de nossos medos, culpas e fantasias.

Encenação – A encenação transpõe a prosa poética e o poder imagético do texto em uma estética interpretativa com cores surrealistas. A cenografia se inspira em espaços arquitetônicos pré-existentes como ambiente cênico, utilizando paredes e pisos como suporte para projeções de vídeo. Apenas objetos essenciais à ação estão em cena. Luz e vídeo conversam intimamente e fundem suas linguagens e potencializam o drama. O figurino onírico e o trabalho de animação gráfica colocam os personagens em situações insólitas. A trilha sonoraoriginal (digital e orgânica num só tempo) em compasso com a pesquisa de movimento e gesto do ator (que cria imagens simbólicas e responde à um vocabulário corporal cifrado) potencializam a atmosfera de cada signo. É nesta afiada lâmina que os atores se equilibram e se arriscam, buscando na fisicalidade uma forma de poesia e na palavra o potencial de apalpar o espectador. A encenação ainda agrega bandas locais para que ao fim do texto o espetáculo não termine, mas se transforme e abra espaço para a música ao vivo. Com transmissão do espetáculo via internet por streaming de vídeo , “FEBRE” se expande e traz, a um só tempo, o público da internet ao teatro e do teatro à internet.

fotos de Ricardo Ferreira e Melina Resende.

Ficha Técnica- Núcleo DRAMAX*
Texto e Direção – Marcos Azevedo
Elenco- Roberta Youssef, Ravel Cabral, Fernanda Franceschetto, Renata Fasanella, Bianca Bertolaccini, Diego Ruiz, Sidney Favini
Pesquisa de Movimento- Ravel Cabral
Trilha/Sonoplastia- Fábio Villas Boas
Iluminação- Mirella Brandi
Cenografia- Marcos Azevedo
Vídeografia- Rodrigo Gontijo e Théo GrahlAnimação gráfica- Gustavo Duarte Filho
Figurino- Karina Montenegro
Assessoria de Imprensa- Vanessa Tozzo
Programação Visual- Pablo Casas
Produção-Marisa Riccitelli Sant´AnaTempo de duração: 1h30min.Faixa etária recomendada:
a partir de 14 anos.

LEIA CRÍTICA PUBLICADA NA FOLHA:

Guia da Folha
TEATRO
De 28 de setembro a 04 de outubro
Febre
Espetáculo procura arquétipos no cotidiano
Sérgio Salvia Coelho

“Febre” é uma peça que assume riscos. Primeiro, o de se adequar à proposta multimídia do espaço GAG (Grupo de Arte Global), um amplo quintal-bar que desde maio se propõe a ser “um pólo agregador e irradiador dos novos cruzamentos da arte contemporânea”. Assim, sem ser uma vídeo-performance, inclui em sua narrativa projeções que criam um universo onírico.

Por outro lado, vai além da pesquisa de efeitos, propondo uma narrativa abertamente simbolista, que lembra o “Sonho”, de Strindberg. Mistura de Alice e Hamlet, Diana (a intensa Roberta Youssef) faz uma jornada iniciática por traumas familiares, com uma verve poética que transborda às vezes das imagens sintéticas, mas que o carisma do Núcleo Dramax* mantém em sintonia com os “descolados” freqüentadores do Gag.

Marcos Azevedo, o autor-diretor, abre o peito sem medo para expor suas feridas pessoais, com a colaboração no texto de seu elenco, e procura tirar uma dimensão arquetípica da fútil elite urbana. Um pouco ingênua, um pouco hermética, pretensiosa no bom sentido, é uma peça que visa alto, se permitindo errar.

Grupo de Arte Global (r. Tito, 79, Vila Romana, tel. 3596-3671). 100 lugares. Sex. e sáb.: 21h. Até 10/11. 90 min. 14 anos. Ingr.: R$ 20. C F I R

Avaliação: bom